domingo, 14 de setembro de 2008

"Maria colocou-se a caminho" (Lc 1, 39)

“Maria colocou-se a caminho” (Lc 1,39)
Reflexão para Zeladores (as) de Capelinhas
Congresso Diocesano – 31/08/2008


1. Primeira Palavra
Estamos diante de uma frase do evangelho de São Lucas. Uma frase que identifica bem a espiritualidade e a missão do Movimento das Capelinhas.
Nas muitas capelinhas presentes na diocese de Ponta Grossa, Maria continua visitando as casas das pessoas. E aonde Maria chega, aí também chega Jesus. Maria é a grande mãe, a mulher que disse sim a Deus, a mulher que traz no seio um filho. Ela visita os lares, assim como visitou a casa de Isabel.

2. O Contexto Bíblico da Frase

O texto em que encontramos a frase “Maria colocou-se a caminho”(Lc 1,39) está situado entre dois versículos que vale a pena considerar aqui.
Em Lc 1,38 lemos: “Disse, então, Maria: ‘Eu sou a serva do Senhor; faça-se em mim segundo tua palavra!’ E o Anjo a deixou.”
Em Lc 1,40 lemos: “Entrou na casa de Zacarias e saudou Isabel”.
Maria disse o seu SIM ao Deus que a veio visitar através do Anjo. O Anjo se afastou e Ela se colocou a caminho em direção à casa de Zacarias e Isabel.
Entre a Visita que Deus faz a Maria e a Visita que Maria faz a Isabel está a caminhada: “Maria colocou-se a caminho!” Outras traduções bíblicas dizem que “Maria se levantou e foi!” e ainda “Maria partiu!”
Maria fez a experiência da caminhada. Caminhar é fundamental para aquele que faz a experiência de Deus. Aquela que estava em casa, num lugar, já que o anjo “entrou onde ela estava” (Lc 1, 28), recebe a visita do anjo, diz o SIM e parte, sai, caminha em direção aos irmãos.
O processo que contempla-se então é o que vai da CASA DE MARIA até a CASA DOS OUTROS. Neste o CAMINHAR é fundamental.
Entre DEUS e os IRMAOS encontramos a CAMINHADA. Quando Deus termina a sua parte (o Anjo se afastou!), começa a parte daquele que é chamado (Maria colocou-se a caminho!).

3. Caminhar na Sagrada Escritura
Caminhar, para a Bíblia é fundamental. Caminhar para o discípulo de Cristo é essencial. Caminhar é o desafio que Deus faz a cada zelador e zeladora da capelinha de nossa diocese. Como Maria que caminhou ao encontro de quem precisava, cada um de nós somos chamados a caminhar em direção a quem necessita.
O povo do Antigo Testamento foi desafiado a caminhar: “Far-vos-ei subir da aflição do Egito... para uma terra que mana leite e mel”(Ex 3,17). Deus não quer que seu povo fique parado, no sofrimento, na escravidão. Ele quer que o seu povo caminhe. Caminhar é preciso! É certamente isso que Deus quer do seu povo. De tal forma Deus quer seu povo caminhando que pede que Moisés vá falar ao faraó: “Deixa o meu povo partir”(EX 7, 26).
E Deus quer que o povo caminhe de verdade! Vejamos o texto do Êxodo: “Quando o Faraó deixou o povo partir, Deus não o fez ir pelo caminho no país dos filisteus, apesar de ser mais perto, porque Deus achara que diante dos combates o povo poderia se arrepender e voltar ao Egito. Deus, então, fez o povo dar a volta pelo caminho do deserto do mar dos juncos....”(Ex 13,17-18). “E Iahweh ia adiante deles, de dia numa coluna de nuvem, para lhes mostrar o caminho, e de noite numa coluna de fogo para os alumiar, a fim de que pudessem caminhar de dia e de noite”(Ex 13, 21).
O povo do Antigo Testamento precisou caminhar, e caminhar muito, sem parar! Deus não quer que seu povo fique parado, no comodismo. Passam pelo mar, ultrapassam o deserto, chegam ao Sinai onde selam a aliança, pecam, mas são sempre desafiados de novo a caminhar: “Vai, sobe daqui, tu e o povo que fizeste subir do Egito.....”(Ex 33, 1).
Enfim, podemos dizer que o povo do Antigo Testamento era um povo sempre desafiado a caminhar. Para eles, caminhar era preciso. O caminhar fazia parte da sua vida.
Quando tomamos nas mãos os textos do Novo Testamento, mais precisamente os evangelhos, encontramos Jesus. Ele era o homem que caminhava. E enquanto caminhava, chamava outros a caminhar com ele. A título de referência, um texto: “Estando ele a caminhar, viu dois irmãos.... Disse-lhes: ‘Segui-me e....’ Continuando a caminhar, viu outros dois irmãos.... e os chamou.” (Mt 4,18-21). Jesus caminhava e desafiava a caminhar! E depois, todos os Evangelhos nos falam de um Jesus que caminhava, da planície à montanha, de um lado para o outro, da sinagoga à casa das pessoas. E a grande caminhada salvadora foi aquela em que tomou a cruz sobre os ombros até o lugar da crucifixão. Jesus caminhou e chamou pessoas a caminhar consigo. Como ressuscitado ele continuou a caminhar com os seus discípulos: “Aproximou-se e pôs-se a caminhar com eles” (Lc 24,15). É a experiência dos discípulos de Emaús.
Seguir Jesus é o mesmo que caminhar! Quem fica parado no seu mundo, fica para trás.
Também Maria, a grande mulher do Novo Testamento e a grande modelo da nossa vida cristã, se colocou a caminho. Maria caminhava! Ela, cheia de Deus, foi ao encontro, caminhou em direção àqueles que precisavam de ajuda.
O povo cristão de hoje é também chamado a caminhar! O Concílio Vaticano II dizia que “a Igreja continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo e as consolações de Deus, anunciando a paixão e a morte do Senhor, até que ele venha” (LG, n. 8). Mais a frente o texto do Concílio diz que “o novo Israel do tempo atual, que anda em busca da cidade futura e permanente, se chama Igreja de Cristo... E ao caminhar por entre as tentações e as provas, ela é fortalecida pelo conforto da graça de Deus....” (LG, n. 9).
A Igreja é povo a caminho também porque os discípulos de Cristo de hoje são os enviados: “Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos.....” (Mt 28,19). Caminhar em direção aos outros é, então, uma exigência. Mais que tudo, hoje, uma urgência!
O Documento de Aparecida lembra que “a Igreja peregrina é missionária por natureza, porque tem sua origem na missão do Filho e do Espírito Santo, segundo o desígnio do Pai”(DA n. 347; cf AG 2).
Em síntese, podemos dizer que o povo de Deus é sempre um “povo a caminho”: da escravidão do Egito para a Terra Prometida; de Nazaré para Jerusalém; deste mundo para a glória eterna.

4. Caminhar sempre, sem parar!

Deus se revela a nós. Ele manifesta a nós o seu amor. Ele nos permite viver momentos extraordinários da sua graça. Com Maria aconteceu assim. Ela recebeu a visita do Anjo. Mas o anjo retirou-se (cf Lc 1,38).
Também os discípulos estavam felizes com a manifestação de Jesus na transfiguração. Tanto que Pedro pede para Jesus: “Rabi, é bom estarmos aqui. Façamos,pois, três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”(Mc 9,5). Era ótimo para eles ficar ali, mas parece que Jesus não permite que eles parem porque logo em seguida lemos: “ao descerem da montanha....”(Mc 9,9).
Parar é uma exigência que nos fazemos constantemente. Mas não podemos parar porque a nossa missão é caminhar, é partir, é ir ao encontro dos outros. Nós queremos parar, mas Deus quer nos ver caminhando.
Não podemos parar!
Será que não tem gente parada por aí?
Os que dizem que já fizeram muito pela comunidade e agora querem descansar, não estão parados?
Os que dizem ou se mostram como aqueles que sabem tudo, não estão parados?
Os que ficam esperando os outros fazer as coisas, não estão parados?
Eu e você, não estamos parados? Não é possível fazer mais, crescer mais, servir melhor? Não posso dar passos ainda?

5. Caminhar para levar Jesus: eis aí a nossa vocação!
Caminhar! Caminhar! Caminhar! Eis a nossa missão!
“Sair de” e “ir para: eis o que significa caminhar!
Partir ao encontro dos outros! Eis a missão especifica do zelador, da zeladora de capelinha.
Colocar-se a caminho, para servir! Eis a nossa vocação.
Caminhar significa deixar o comodismo. É sair da cadeira. É abrir o portão de casa e bater na porta da casa e do coração das pessoas. Tudo isso é muito simples e, ao mesmo tempo, extremamente complicado em nosso tempo. Mas é esta a nossa missão.
Os doentes precisam de uma palavra, de uma mão que ajude. Também precisam que lhes sejam trocadas as fraldas e que alguém lhes alimente. E esta não é a nossa vocação?
Muitas mães estão desesperadas porque foram traídas, abandonadas por seus filhos. Não é nossa missão ir ao encontro destas senhoras?
Muitas famílias não sabem mais rezar, nem mesmo sabem que Deus é amor. Não é nossa tarefa ir ao encontro delas?
Muitas pessoas precisam de ajuda. Isabel precisava e Maria foi ao seu encontro. Não somos chamados também a “colocar-nos a caminho”?
Mas é preciso levar Jesus, como Maria fez.
Levar Jesus e não normas a seguir!
Levar Jesus e não as últimas notícias que acontecem na paróquia ou entre os visinhos! (Em outras palavras, levar Jesus e não as fofocas!)
Levar Jesus e não um coração cheio de si mesmos!
Levar Jesus e não julgamentos, críticas e até condenações!
Levar Jesus através da disposição de servir!
Levar Jesus com muita simplicidade, alegria e sem medo!
Levar Jesus que enche de sentido a vida das pessoas!
Levar Jesus, como fez Maria que colocou-se a caminho!

Caminhar! Partir! Ir! Ser Missionário de Jesus. Mostrar Jesus de verdade! Que vocação maravilhosa e comprometedora Deus nos confiou!

6. Guiados pelo Espírito Santo
Mas o Espírito Santo, o mesmo que tornou fecundo o seio de Maria, o mesmo que conduz a Igreja, o mesmo que deu coragem, força e alegria a tantos que viveram antes de nós ou exerceram a missão que hoje é nossa, há de nos plenificar de graça e luz. O Espírito Santo há de fazer novas todas as coisas e também a nossa vida e missão.
“Ele, que foi derramado em nossos corações, geme e intercede por nós e com seus dons nos fortalece em nosso caminho de discípulos e missionários”(DA n. 23).
Caminhemos, cheios do Espírito Santo, para que Jesus seja conhecido, amado e seguido por todos aqueles que nós somos chamados a servir.
Coloquemo-nos a caminho, como Maria.

Pe Evandro Luis Braun,
31 de agosto de 2008.
(Texto usado em uma reflexão no Congresso Diocesano do Movimento das Capelinhas em 31 de Agosto de 2008 em Ponta Grossa-PR)

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